Dani Nobile

Os quês e porquês

Sabadão eu completei 1 ano e 5 meses de lesão. E estava me preparando pra falar sobre isso, com um poeminha especial pra dor, que eu criei pra ver se ela tem dó de mim e vai embora ( :p ), e com um texto que um amigo cadeirudo compartilhou no nosso grupo.

Porém, ontem à noite, uma polêmica, sobre a recuperação do lesado medular, foi levantada. Foi ao ar uma reportagem sobre a Laís Souza, atleta brasileira que sofreu uma grave lesão na medula.

Imediatamente fomos todos para o Facebook  e demais redes sociais, expressar nossas opiniões a respeito. Algumas, inclusive a minha opinião (não precisam concordar, porque é minha!rs), compartilharei aqui. Não citarei nomes completos dos amigos, pois não pedi autorização à eles.

Escrevi sim, e uma amiga também escreveu, que sentimos inveja da Laís, por poder receber células tronco logo no início da lesão medular. Isso pode ser decisivo nos resultados do tratamento. Vejam bem, PODE! Não quer dizer que será. Isso porque os resultados do tratamento com células tronco ainda não foram comprovados. Como bem disse uma amiga, a reportagem só serve para encher nossa cabeça com “e se”. Sim, e seu eu tivesse tido a oportunidade de receber as células tronco logo no início do tratamento? Seria um ratinho de laboratório, sim, uma cobaia nos estudos. Mas será que eu não estaria melhor? No meu caso, estar melhor não significa necessariamente estar andando. Eu penso, será que eu já conseguiria abrir garrafas de água mineral? Será que a cebola, a carne e a faca não escapariam da minha mão quando eu vou cozinhar e os pedaços não ficariam tão grandes? Será que eu não sentiria tanta dor, todo santo dia, e não precisaria de tantos remédios pra suportar? Será que minhas pernas não seriam tão geladas? E quais seriam os efeitos colaterais do uso de células tronco, a longo prazo? Eles existem? É…um montão de “e se”….

Enquanto isso, Laís recebe tratamento de ponta, com todos os recursos e oportunidades que todos nós desejamos ter recebido no início da lesão (e sonhamos até hoje, por que não?). E não está gastando nada por isso! Mesmo porque, com salário de atleta no Brasil, ela não conseguiria custear o próprio tratamento. E, apesar de ter sofrido o acidente quando estava a serviço do Comitê Olímpico, em treinamento pras Olimpíadas de Inverno, o governo faz vaquinha pra que nós paguemos o tratamento dela. Fala sério? É isso mesmo?

Ontem, Laís deu entrevista e, quando perguntaram à ela “E se a sua recuperação não for como você sonha?”, ela fez cara de pavor e disse que tem medo. Dá medo mesmo, dá pavor mesmo. Mas ela podia ter dado um sorriso e dizer que vai participar de esportes paralímpicos. (Gente, essa é a minha opinião). Quando eu estava com o mesmo tempo de lesão que ela está hoje, eu já tinha o plano A (voltar a andar) e o plano B (caso andar não rolasse, como ainda não rolou). Será que não está faltando alguém sentar com ela e conversar francamente sobre as possibilidades?

A Cris (só vou usar essa parte do nome), disse algo muito legal na nossa discussão: “… eu imaginei que a emissora iria prestar esse desserviço a nós, e fazer milhares de lesionados medular irem dormir com a sensação de “e se”. Ao invés de mostrar a nossa realidade, de que há vida após uma lesão, pow vc mesmo acabou de passar por tudo isso e está aí, recuperou acima das expectativas e está vivendo. Pq não mostrar isso? Mas escolhem sempre mostrar como se uma pessoa com lesão está condenada, e se não for 100% curada será infeliz. Isso me incomoda, pq não ajuda em nada. (…) Com tratamento ultra mega blaster avançado ou não a verdade é uma só. Laís (assim como qualquer um de nós) só volta andar se acontecer um milagre. É uma dura realidade? Sim, é. Mas eu considero melhor viver com fé e ir se virando como dá, do que viver iludido se frustrando a cada tentativa fracassada. Bóra tocar a cadeira e pronto. rsrs”

Aparentemente, os médico só falam pra Laís sobre o tratamento (Não sei, não to lá pra ver. Mas é o que parece!). Mas alguém contou pra ela sobre Fernando Fernandes, Tabata Contri, Carla Maia, Edênia Garcia, Jairo Marques, Carolina Ignarra, Cris Côrrea, Billy Saga, Marcelo Yuka, Mara Gabrili, e tantos outros cadeirantes famosos em suas áreas de atuação, seja no esporte, no trabalho, na música? Alguém? Alguém contou pra ela que existe muita vida, amor, amizade, sexo, casamento, filhos, carreira, esporte, lazer e muito mais, mesmo estando na cadeira de rodas?

Há 10 anos atrás, meus amigos que sofreram com lesão medular, paralisia, mielo e tudo o mais, não tinham a internet à disposição, com tantas informações e tanta gente pra conhecer e com quem aprender. Mas hoje tem, né?!

Eu entendo que cada um tem seu tempo de aceitação. Realmente não é fácil. Tem dias que dá vontade de jogar a cadeira na parede e sair correndo (acho que já falei isso antes). Mas quando não enxergamos sozinhos as possibilidades, talvez precisemos de ajuda pra que isso aconteça.

Torço, do fundo do coração pra que o tratamento da Laís seja o mais eficaz possível. Mesmo porque isso abriria portas pra mim e pra tantos outros que desejam voltar a andar e buscam meios pra isso. Porém, se  não acontecer, vem pra cá, Laís! Como bem disse um amigo cheio de razão, tem um bando de quebrados malacabados, prontinhos pra te ajudar e te ensinar a viver feliz e saudável sobre rodas!